sexta-feira, 25 de novembro de 2016

A Psicologia e os desafios dos novos tempos



Sabe-se que a psicologia teve início em meados do século XIX com os estudos paradigmáticos de Freud, inúmeros outros autores inspirados no pensamento freudiano deram segmento aos estudos psicanalíticos. As escolas que foram se formando não foram necessariamente fieis aos escritos desse autor renomado, mas torna-se impossível falar de psicologia sem fazer referência direta a esse autor.
Embora essa disciplina seja relativamente nova, em comparação a outras áreas do conhecimento seus pressupostos são encontrados nos escritos mais remotos dos primeiros filósofos. A preocupação filosófica baseava-se em conhecer o que é o ser humano, mesmos elementos que a psicologia se preocupa. O que ocorre na contemporaneidade é uma emancipação dessa disciplina de grandes áreas do conhecimento.
O fato dessa área ser nova e com inúmeras possibilidades e caminhos não deram aos seus estudiosos a homogeneidade de teorias e métodos. Isso fez com que surgisse ramificações da psicologia com enfoques diversos.
Um exemplo do que estamos tratando aqui pode ser encontrado nos estudos comportamentais. Cito aqui duas teorias que teve a preocupação de explicar por meios científicos porque agimos como agimos e porque não agimos de outro modo. A primeira é a Janela de Johari e a segunda é baseada no Eneagrama dos quatro temperamentos. Embora as explicações para as atitudes humanas sejam diferentes o pressuposto é o mesmo, a saber: entender o gênero humano em sua complexidade.
A psicologia é uma disciplina que teve origens teóricas, no entanto, há uma tendência em reduzi-la somente à técnicas, não servindo a explicação de quem é o ser humano. Na interação entre o profissional da psicologia e os leigos pode ocorrer uma ideia, própria do sistema econômico, que reduz tudo e todos a uma relação profissional-cliente. E o psicólogo deixa de ser um pensador para ser um prestador de serviços. Grosso modo, isso não é ruim, pois faz com que o largo conhecimento produzido nos laboratórios e bibliotecas voltem para a sociedade de maneira positiva. O problema é que os custos de um bom profissional ainda são onerosos e nem todos que precisam tem acessos a esses conhecimentos.
Uma crítica recebida por essa área do conhecimento no Brasil é que ela deixou de ser reflexiva por fechar-se em si. Sem considerar as questões históricas em detrimento do biológico ficando totalmente passiva diante dos acontecimentos políticos. Pensadores que fazem essas considerações geralmente são de tendências marxistas, e consideram a atual psicologia como ferramenta de manipulação do capital, engrenagem do sistema. Essa interpretação é no mínimo simplista quanto ao que de fato ocorre nos estudos científicos no Brasil.
Um grande problema nos estudos acadêmicos é que associa-se senso crítico com o pensamento de marxistas ortodoxos, que tomaram a cadeira de críticos sociais e não aceitam pensamentos divergentes também como bons.
É compreensivo o grande teor do pensamento marxista em alguns desses textos, pois estes autores estão lutando contra o conceito de que as ideias valem por si e os autores e teóricos da psicologia que desconsideram os quadros sociais na interpretação da explicação da razão de uma teoria.
A sistematização da psicologia enquanto área de conhecimento científico ocorre de modo tardio, conforme apontamos no início dessa redação, no entanto, não significa que deva haver uma minoração de sua área de conhecimento perante aquelas que são mais antigas.
O que ocorria no século XIX que potencializou o surgimento dessa área do conhecimento? Tenho a intuição de que a acentuação nas individualidades, típicas da modernidade foi um dos motivos para a preocupação dos estudos do psicológico, a segunda intuição é que antigas respostas aos comportamentos que outrora tinham explicações mitológicas tais como histeria, possessão dentre outros, necessitaram de novas respostas.
Interessante apontar que reações emocionais não operam somente no cérebro, mas principalmente nas questões fisiológicas, as reações que operam no nosso corpo fazem com que emoções ocorram, não são somente coisas da alma ou do espírito. Essa foi uma das grandes contribuições da psicologia para fugir das antigas explicações míticas.

Concluo, portanto que os desafios para os profissionais dessa área ainda são muitos e que os mesmos não conseguiram a superação desses problemas se privilegiarem apenas uma área do aspecto humano, um resgate a interdisciplinaridade das ciências humanas pode ser positiva nas novas contribuições da psicologia e seus novos questionamentos no presente século.

segunda-feira, 21 de novembro de 2016

A teologia nos entre caminhos da fé e razão



Ao se discutir, nos dias de hoje, sobre uma área de conhecimento é praticamente impossível excluir os critérios da razão científica que ganharam formas e contornos após o renascimento. Atualmente vive-se debaixo dos paradigmas científicos que afirmam os valores da modernidade no que diz respeito ao conhecimento. Esses critérios dialogam-se em absoluto com a teologia, ora em sua afirmação e ora em sua negação, ao menos essa é a impressão que se tem quando olha-se mais detidamente àquela teologia que procura ser confessional e defensora de dogmas.
Em muitos casos pretende-se, com o saber teológico, defender a religião e para isso se apropriam de ferramentas científicas que cooperam com esses fins. Esse jogo, do qual esboçamos aqui diz respeito a duas questões simples: a primeira devido a teologia não ser mais hegemônica como era outrora tendo a última palavra nos quesitos da verdade, e a segunda por, a princípio, tratar de temas que são metafísicos a priori, resultando assim em dicotomias de pensamentos. Outra questão, mais ligada a teologia cristã é que seu objeto de estudo (Deus) não pode ser provado por definição – no momento em que prova-lo deixa de ser Deus – o que torna-se um problema para a teologia se seu desejo é mostrar por critérios científicos Sua existência.
Como entender, portanto, uma área de conhecimento que carece da fé como motivadora de ação e que tem relevância social em período que o cientificismo torna-se critério último? Creio que encontramos aqui em um empasse para a teologia nos tempos hodiernos entre a fé e a razão.
A teologia sistemática dialoga com essa tendência em muitos de seus pontos, pois é seduzida a explicar Deus e dogmas através de critérios científicos ou filosóficos mas que comumente são aceitos por simples atos de fé. O empasse em que a teologia se encontra pode ser problemática em seu pressuposto inicial que é dar subsídios aos crentes para suas peregrinações diante do sagrado.
Na verdade, há um medo velado por parte de alguns teólogos em não terem o reconhecimento social de seu trabalho intelectual por abordarem um objeto de estudo que é indefinível a priori. O que está em jogo, portanto, acaba não sendo os resultados das reflexões tidas com o pensamento teológico e sim o status que o teólogo adquire com seu trabalho nos circuitos acadêmicos.
            O oposto também pode ser um problema: a afirmação de que a teologia é apenas revelação e não pode ser abordada por outras ciências abre margens para arbitrariedade do teólogo em suas afirmações doutrinárias. A história do cristianismo está cheia desses exemplos. Ou seja, em nome de uma revelação, poderes políticos e eclesiásticos são reafirmados e por vezes o povo subjugado.
            Nos anos 60 no Brasil e América Latina uma nova forma de se fazer teologia procurou dar respostas a esses paradoxos argumentativos, mas que não foi muito bem aceita em meios mais ortodoxos da igreja, refiro-me à Teologia Latino-Americana da Libertação nos setores católicos e a teologia da Missão Integral nos meios protestantes.
O Padre Uruguaio Juan Luiz Segundo foi um desses pensadores de peso que conseguiu unir o que de melhor a teologia pode oferecer ao povo com a excelência do pensamento reflexivo. Seu trabalho pode ser uma ponta de esperança e exemplo para aqueles que desejam fazer teologia a fim de afirmar crenças e religiosidades na completude da humanidade no diálogo entre fé e razão.
            Outra questão que a teologia deve enfrentar diz respeito aos fundamentalismos e intolerância religiosa que muitas de suas verdades podem ocasionar nos fiéis. De um lado encontram-se certezas que devem ser aceitas para que a vida tenha sentido e do outro está o diferente que pensa completamente o oposto de nós e tem uma teologia e modo de vida que nega por contraposição de termos o eu. Ser teólogo numa situação dessas sem entrar em crises existências e não negando a existência do outro envolve auto grau de maturidade, tanto intelectual quanto de fé.
O pressuposto para se fazer teologia acaba sendo adquirir o direito de (em nome de Deus) reger influência sobre o modo de vida e comportamento das outras pessoas e essa forma de pensar impede que outras tradições religiosas tenham espaço. Sendo esse um dos pilares das guerras santas, tanto do passado quanto dos dias de hoje.
            Nessa redação não pretendo chegar a definições pontuais, conforme já puderam ver, mas tive por objetivo inicial mostrar os atuais desafios que os teólogos, líderes religiosos e fieis têm diante da contemporaneidade.
            Conhecer a historiografia da teologia e seus possíveis caminhos dão bases para que os novos teólogos e fiéis conheçam mais da sua fé e adquiram essa maturidade de forma mais rápida e com melhor qualidade, creio que Schultz faz isso muito bem em sua tese de doutorado que apresenta a nebulosa religiosa brasileira presente no atual protestantismo. Seu texto é um exemplo claro de que é possível fazer teologia sem se deixar seduzir e enganar por concepções prévias que atrapalham os resultados desejados nos estudos teológicos.
            É notável sua teoria de que Deus está presente e o diabo está no meio. Essa ideia sintetiza muito bem o que ele chama de nebulosa religiosa. Não descartando a ideia de que esse mal que está presente tem causas materiais, o religioso apenas não sabe expressar de forma didática, por isso, a relevância dos teólogos que colocam em palavras o que é sensitivo no cotidiano.

            Concluo, por fim considerando que os caminhos para a teologia na contemporaneidade estão abertos ela pode encontra-se pode ser de grande valia as pessoas se transitar bem nas argumentações científicas sem esquecer o cotidiano daquele que crê.

quarta-feira, 19 de outubro de 2016

A Ciência da religião enquanto disciplina acadêmica


            Nesse texto trabalharei as Ciências da Religião enquanto área de conhecimento e possíveis discussões a respeito de sua existência, considerando a pergunta: à que serve os estudos religiosos nos dias de hoje? Objetiva com esse escrito ser coerente com as recentes discussões sobre o papel das religiões na sociedade contemporânea.
            Ver o crescimento de uma área que se preocupa em estudar as religiões nos dias de hoje pode até parecer um contrassenso com aquilo que fora profetizado ao longo de todo o período moderno, de que a religião teria fatalmente seu fim e que isso era apenas uma questão de tempo. Pensadores como Karl Marx, Freud dentre outros caminham nessa mesma ideia.
            Atualmente essa imagem cada vez mais é questionada, pois a religião tem um crescimento substancial na organização de sentidos da vida das pessoas e também na estruturação de aspectos sociais. E, com isso questiona-se o juízo outrora propagado de que a religião estava ligada invariavelmente à alienação.
            Max Weber foi um dos autores que trabalhou longamente sobre o papel da religião na modernidade, para ele as estruturas sociais chegariam a tal ponto de racionalidade que não haveria espaço para a explicação da vida pela religião. A dessacralização do mundo, na interpretação desse autor, era caminho sem volta. Embora ele considere que outrora a religião tivesse um papel importante para a sociedade de modo geral. Weber não foge ao paradigma de seu tempo de que crê cabalmente no fim da religião e a supremacia do mundo desencantado, explicado pela racionalidade científica.
            A ética em Weber não tem uma questão moral, o que atualmente é atribuído como propriedade da religião, mas tem a ver com um ethos, ou seja, um modo de vida que tem no cotidiano uma influência no comportamento das pessoas.
            Sendo assim, ele consegue aplicar aspectos religiosos nas questões cotidianas. Em seu livro mais famoso “Ética protestante e o espírito do capitalismo” encontra-se como o asceticismo protestante foi capaz de contribuir para a estruturação da sociedade capitalista. Porém, no mesmo livro ele conclui que o capitalismo pode sobreviver sozinho sem a contribuição protestante.
Esse autor fala de ética cristã que refere-se ao cotidiano. Como foi possível o surgimento dessa ética? Quem contribuiu para ela? Para Weber foi Paulo quem a criou e a desenvolveu. A partir daí já podemos considerar que o papel das religiões não estão somente no âmbito individual, mas também em influências sociais.
            Os estudos a respeito da religião não se resumem às questões teológicas, como comumente se observa, mas também em temas ligados à psicologia, História, Filosofia e outras disciplinas acadêmicas.
            As reflexões que são apresentadas aqui também dizem respeito à métodos e a forma de abordagem das ciências da religião em relação ao seu objeto. Exercício que basicamente todo pesquisador deve incorrer para delimitar sua pesquisa e não sofrer o risco de ser interpretado equivocadamente.
            A questão e pergunta se a religião detêm uma essência própria é a razão de muitos se voltarem à fenomenologia. Essa questão da essencialidade da religião diz respeito a duas coisas. A primeira é sobre a autonomia da religião em realizar seu trabalho sem sofrer ataques de outas áreas e a segunda diz respeito a ideia de que as religiões tem um estrutura essencial, comum a toda e qualquer religião.
            Somente a temática da essencialidade da religião já abriria campo para longos debates, o que não nos interessa nesse momento, mas é bom ressaltar esse ponto para mostrar a complexidade que os estudos das religiões suscitam em sua área de reflexão. Fazer, portanto, estudos de religião não está no nível da curiosidade e sim em real interesse de compreender como está estruturada a sociedade que não deixa, e ao menos onde se sabe, não deixará de ter aspectos religiosos em sua estruturação social.
            Entra-se no debate também a preocupação de situar as pessoas licenciadas para o Ensino Religioso ressaltando que o mesmo terá a função de sintetizar o conteúdo apreendido pelas ciências da religião.
            Durante anos o ensino religioso tinha o caráter catequético, essa linha vem da época em que a cristandade gozava de hegemonia social.
            Nos dias de hoje, portanto, os estudos a respeito de religião não servem para converter o estudante a uma doutrina, mas sim para compreender as diversidades sociais e culturais existentes no mundo, podendo auxiliar no diálogo entre os diferente pensamentos e visões de mundo.
            Não se tem mais a ideia de que a religião é parte do passado e não pode dar contribuições a estruturação social. O que não se pode reafirmar é que em nome de uma doutrina ou pensamento religioso o Estado deva forçar as pessoas a seguirem uma lógica de pensamento. Da mesma forma que se valoriza a diversidade cultural valoriza-se também o direito de escolha dos indivíduos em seguirem o caminho que acharem melhor.
            O ensino de religião nas escolas públicas e privadas devem estar em sintonia com essa forma de pensamento. Assim, um futuro novo será construído com forte contribuição da Ciência das Religiões.
            Trabalhei nessa redação a questão da religião nos dias de hoje, qual sua importância e a que ela serve? O texto incorreu sobre a forma como ela fora observada por pensadores clássicos na modernidade, mas que atualmente não tem a mesma conotação que outrora tivera.
            Concluímos, por fim, que os estudos de religião são importantes para valorização da diversidade religiosa e cultural e não para a pregação de uma doutrina cristalizada pelo tempo ou pelas relações de poder.

terça-feira, 18 de outubro de 2016

Onde está Deus no sofrimento dos justos?


          O livro de Jó é paradigmático ao expressar um pensamento e uma teologia, na resposta a pergunta: Porque sofrem os justos?
            Sua história é clara ao mostrar que a perfeição de um homem não o livrou do sofrimento e da dor.        
            As dores na vida de Jó foram as piores possíveis, sofrendo problemas financeiros, familiares, saúde, psicológico dentre outros.
            A visão que as pessoas tinham de Deus no tempo de Jó era a da recompensação, ou seja, se fossem bons Deus daria recompensas boas e se fossem maus a punição viria imediatamente. Essa ideia a respeito de Deus consegue ser eficiente até certo momento, portanto, mostra-se em dificuldades para explicar porque sofrem os justos. No capítulo 2 e versículo 3 do livro de Jó o próprio Deus da testemunho de que Jó sofre sem justa causa.
            A visão que temos é que Deus é todo-poderoso e bom, e que por ser onipotente e deseja fazer o bem quer ver os seres humanos felizes e sem sofrimento. A questão é que por vezes encontramos essas pessoas que são boas e fieis sofrendo, qual a coerência portanto entre a visão que temos de Deus e a triste realidade humana?
            Dizemos no íntimo que são hipócrita os justos que sofrem porque a visão que temos do santo não nos possibilita dizer que Ele aceite o sofrimento dos justos até porque isso seria injustiça, mas, o certo é que pessoas justas, na medida da possibilidade humana estão sofrendo.
            E a melhor resposta para essa incógnita está no livro de Jó. Este livro mostra que esse homem era justo a tal ponto de que o próprio Deus dera testemunho de sua vida. Mesmo assim ele sofreu.
            Ao olhar aquela criança de três anos que foi encontrada morta na praia ao tentar fugir do terrorismo com seus pais nos perguntamos o que essa criança fez para que tivesse tal fim? Aqueles que querem preservar a ideia de que Deus é responsável por tudo diz que são os pecados dos pais, muçulmanos, que caíram sobre o corpo daquela criança.
            Esquecemos que o Deus apresentado por Jesus diz que cada um é responsável pelo seu pecado e portanto os filhos não podem ser culpados pelos pecados dos pais.
            Mas a pergunta permanece, porque sofrem os justos e os inocentes?
            No versículo 7 do capítulo 42 Deus se volta aos amigos de Jó que o haviam acusado Jó de pecado para defender a imagem de Deus, e Deus fala veementemente contra ele e seus amigos. Afirmando que sua ira se acendeu sobre o Temanita por não falar de Deus o que era reto.
Da mesma forma devemos ter cuidado quando em nome de uma teologia acusar um irmão ou julgá-lo. Deus está muito além da imagem que temos dEle.
            Apesar disso, a pergunta permanece: onde está Deus no sofrimento dos justos?
            Pela revelação de Cristo, Deus está junto com aqueles que sofrem. Se você for o causador da injustiça, certamente Deus está contra você. Se o cristão for o causador da injustiça Deus estará ele, independentemente da placa denominacional.
            Deus está junto com a vítima do estupro, não importa que seja cristã, muçulmana, umbandista. Deus está com os desapropriados da terra, não importam que sejam petistas americanas ou africanas. Deus luta em favor daqueles que são injustiçados.
            O melhor que fazemos é nos calar diante do incompreendido, pois sabemos mais de Deus no silêncio do que na argumentação.

sábado, 16 de julho de 2016

Despindo-se das armaduras (II Reis 5 1-8)

Para a reflexão de hoje baseio-me no segundo livro dos Reis no capítulo cinco. Nesse texto encontra-se a história de um milagre recebido por Naamã, um líder do exército Sírio. A vida desse homem é bem conhecida e muitos já cantaram hinos a respeito dele nas escolas dominicais. Hoje, portanto, quero me aprofundar no que esse milagre representou para a sociedade da época.
Após definir as questões sociais daquele momento irei trabalhar esse milagre do ponto de vista individual. Ou seja, o caminho trilhado será do macro para o micro. Das questões sociais da bíblia até as questões individuais.
Faço esse caminho para mostrar que o sentido da realização dos milagres não são as satisfações individuais, mas sim referem-se aos propósitos que estão por detrais dos acontecimentos. Nesse caso propriamente a valorização da mensagem do profeta Eliseu, que naquelas circunstâncias denunciava a idolatria de Israel.
O Rei de Israel nesse tempo era Jeorão, filho de Acabe e Jezabel, que seguiu os mesmos caminhos de idolatria de seus pais.
Antes do período monárquico não havia a necessidade de Deus levantar profetas, quem exercia a função de liderança eram os Juízes. Porém, Com a unificação do poder houve a necessidade de profetas, que falavam o que Deus desejava.

Considerações históricas, políticas e sociais do milagre de Naamã

Um milagre, por mais individual que seja e por mais isolado nunca é individualista, pois está incluso em contextos sociais. Com o caso de Naamã não é diferente. Esse acontecimento representa mais que um homem desesperado a procura de um milagre, pois diz respeito aos conflitos existentes entre duas nações.
Vamos aos fatos: (I) Naamã sabe do profeta através de uma escrava. Isso mostra que já houve batalhas entre Israel e os Sírios e estes venceram levando boa parte da população civil para servir de escravos. A guerra foi amenizada através de uma subordinação dos Israelitas onde esses mesmos deveriam pagar impostos.
Não havia nos planos de Deus nenhum desejo de salvar Israel dos Sírios. O próprio Deus havia dito que o Rei da Síria era seu Servo e o usaria para corrigir a Israel, tanto é que alguns anos depois isso de fato ocorreu, permanentemente

(II) Haviam diferentes concepções sobre Deus. Para o rei da Síria era alguém que poderia fazer sua vontade através de barganhas.
Ele tem o desejo de ver seu Capitão curado e para isso manda muitos presentes para o Rei de Israel com essa finalidade. A sua mente funcionava a partir de uma lógica matemática. Quanto devo dar para obter o que quero?
Essa ideia é muito comum nos dias de hoje, com forte influência das barganhas encontradas na lei de oferta e procura dos dias de hoje, prevalecendo a ideia de que Deus é um produto e Jesus é uma mercadoria que vende bem.
O deus do Rei da Síria era aquele que podia ser comprado com sacrifícios, o nome disso é magia, acredita-te que pela mandinga pode-se manipular o sagrado. Não existe aqui uma ideia de sujeição a Deus e sim de manipulação para força-lo a fazer as vontades de quem sacrifica.
No relacionamento com essas divindades a pergunta sempre caminha no seguinte: o que devo fazer para alcançar minha vontade? Quanto de presentes e ofertas devo entregar para ter sucesso?
Nos dias de hoje essa teologia ganhou corpo e sistematização, podendo ser chamada de Teologia da prosperidade. Observe que não estou dizendo que Deus não pode prosperar a vida do fiel, nada disso, apenas afirmo que na bíblia todas as vezes que alguém sacrifica algo para receber benesses ou forçar Deus a fazer o que Ele não aprovou, acabou praticando a feitiçaria. Os sacrifícios na Bíblia são sempre em gratidão, remissão de pecados e adoração, nunca para prosperidade. São os ídolos que gostam de receber presentes para realizarem algo.  
Deus jamais aceitou ser manipulado por quem quer que seja. Nossa oferta, portanto, não é para fazer com que Deus se sujeite a nós e sim para que reconheçamos seu poder.

Para o rei de Israel era um ser poderoso, mas que estava distante demais para ajudar. Certamente ele ouviu falar dos milagres que Deus operou no passado, mas estava tão mergulhado em seu cotidiano que não conseguia se livrar das leis naturais e já não acreditava nos milagres de Deus. Suas experiências o remetiam somente ao passado e Deus para ele era apenas uma estória.
Caso não conseguisse realizar os desejos do rei da Síria uma nova guerra poderia ser estabelecida. E isso era ruim porque Israel nessa época era visivelmente inferior.
Para a menina era o Deus da provisão, aquele que fornece o pão na hora da necessidade. O sofrimento, ser tirada do meio do seio de sua família, e todas as dificuldades que a vida lhe atacou, fez com que ela se agarrasse fortemente em Deus. Porque poderiam tirar tudo dela, sua casa, sua família, tirá-la de seu templo, de sua cidade, mas não conseguiram entrar em seu coração e mudar a visão que ela tinha de Deus.
Ela não queria saber das lutas políticas e religiosas existentes em nome de Deus. Não queria saber de doutrinas e teologias que discursavam a respeito de Deus. Ela apenas adorava e servia a Deus.
Quando ela vê que Naamã era leproso não guarda para si o que Deus poderia fazer, mas sim, procura prontamente dar testemunho de Deus e de seu profeta.
Para Naamã era o último recurso de sua vida, a última aposta de tantas outras que já procurou para obtenção da cura. Estava desesperado. Provavelmente já tinha zombado da fé dos Judeus, mas a necessidade o fez chegar diante de Deus. E portanto, não tinha outro caminho a fazer a não ser se submeter a Ele, porque tudo o que ele procurou anteriormente não tinham surtido resultado.
(III) O Rei de Israel estava em conflito com o profeta. Eliseu já há muito denunciava a idolatria da casa real e insistia que o único Deus a ser adorado deveria ser Javé.
Essas questões não são simples, porque o reino estava em reais perigos e para manter a vida das pessoas o rei de Israel se envereda para a idolatria. E, diversas visões e interpretações sobre Deus estavam em jogo.
Haviam problema entre profetas e reis. Onde Eliseu dando sequencias ao ministério de Elias denuncia a idolatria contida na vida da comunidade de Israel. Idolatria advinda das alianças que o rei realizou para garantir seu posto. Ou seja, o rei perverteu princípios para que garantisse seu poder.
O rei reconhece a sua limitação e rasga suas vestes, pois a não realização desse milagre poderia ser conhecido como ato de subversão. Até porque, Israel não foi destruído em outras ocasiões pela ação milagrosa de seu Deus. Se o rei dissesse que não tinha poderes para curar esse homem poderia haver a interpretação de que esse Deus havia perdido o poder e que por isso poderiam ser novamente atacados e destruídos. 
Eliseu não estava bem com o rei de Israel, este havia feito o que era mal aos olhos do Senhor. O rei de Israel estava em apuros. O milagre de Naamã foi uma disputa de poder entre qual o Deus verdadeiro. Se era aqueles seguidos por Israel ou o Deus de Eliseu.
A cura de Naamã foi um ponto chave no ministério de Eliseu que mostrou qual o Deus verdadeiro. Profetas e reis são contemporâneos. Na bíblia os profetas só surgem depois que se cria a monarquia. Os profetas servem como parâmetro e bússola para mostrar aos reis quais os caminhos a seguir. Pois, a tendência dos reis é se guiarem pelos seus próprios trilhos.
Eliseu pede para que Naamã fosse até ele quando sabe que o Rei rasgou suas vestes (II Reis 5: 7), em um momento de desespero do Rei. Essa é uma disputa para ver quem de fato estava com a verdade. Se era Eliseu seguindo seu Deus ou era o Rei com as alianças políticas que ele havia feito. E nessas alianças estavam também a aceitação irrestrita dos deuses dos outros governantes. A luta aqui é contra a idolatria.
Os pontos mostrados até esse momento são referentes às questões macro históricas, vejamos como elas exercem força sobre os pontos individuais da vida de Naamã.

O conflito de Naamã

Naamã tinha alguns problemas pessoais que precisavam ser resolvidos. Ele era homem de muito sucesso e conquistas, porém estava com lepra. Essa doença, em muitas culturas, era sinal de maldição.
Ele era um chefe do exército e estava leproso. Haviam dois sinais diretos em sua vida. O primeiro é que este era um vencedor pelas batalhas que conquistou e a segunda era o sinal de maldição estava sobre sua vida devido a lepra. Duas situações completamente antagônicas.
Naamã não era Israelita, pois se fosse deveria estar em um leprosário (devido a cultura dos Israelitas), em local afastado da cidade. Na verdade eles faziam isso para que essa doença não se espalhasse entre os demais e consequentemente a maldição também não se espalhasse.
      Poucas eram as pessoas que conheciam a fragilidade desse soldado. A maioria das pessoas viam somente sua armadura, seus familiares, porém lhe conheciam como o leproso, aquele que estava desesperado por uma ajuda.
Enquanto muitos tinham ideias divergentes sobre Deus, esse homem é levado até Deus por uma necessidade, como recorrentemente ocorrem nos dias atuais.
Não se pode julga-lo por isso. É normal do ser humano estar preocupado com outras coisas durante a vida.
Um ponto interessante da vida desse soldado é que enfermidade lhe reestabeleceu prioridades. Fez com que as coisas que realmente tivessem valor voltassem a mente. Geralmente os seres humanos nunca se preocupam com a saúde até que a idade chega.
Reconhecer a fragilidade é um ato de coragem, foi essa a indicação do profeta Eliseu para ele. O maior milagre não foi Naamã ter recebido a cura, mas sim ele se aceitar como de fato era, um leproso que precisava da provisão divina.
Conclusão

As questões históricas existem e não podem ser ignoradas. Elas são decisivas e importantes para o desenrolar da história. Como nesse caso a história de Israel estava em jogo no conflito com os Sírios.
Apesar dessas questões macro, também existem as razões micro que envolvem nossas vidas e cotidianos. No caso de Naamã isso é evidente.
Muitos poderiam questionar se Deus estava preocupado com alguns anos a mais na vida de um homem que nem judeu era. Minha resposta é sim. Ele estava preocupado com a vida de Naamã enquanto outros de Israel estavam morrendo precocemente.

Dizer que tenho respostas para esse desparate, na verdade não tenho. Apenas posso dizer que o que ocorre com Naamã tem apenas um nome: Graça! E é em nome dela que a história sucede seu curso. 

quinta-feira, 7 de julho de 2016

Sobre libélula e liberdade

Ontem, não sei como e nem por que uma libélula entrou em casa, deixei-a em boa companhia durante a noite com outros insetos de boa qualidade - não sem uma boa dose de SBP - e hoje estava ela tentando fugir de todas as maneiras pela janela transparente. Frustrada estava por não conseguir ganhar os céus que jazia tão perto e ao mesmo tempo tão distante. Um pássaro - desses que cagam no carro da gente - avistando-a queria pegá-la de qualquer forma, já sentindo no paladar o gosto daquele pequeno e suculento bichinho.
E eu – como um bom cristão - vendo aquela situação pensei na sorte da libélula em estar protegida dentro de casa e quão perigoso é o mundo lá fora. Estar confinada, portanto, iria lhe ausentar de muitos perigos.
Tentado pelo diabo – e não sem um certo prazer - abri a janela esperando o assassinato mordaz daquele pobre animal e para surpresa e frustração o inseto fugiu de maneira shulmarcheana. Vendo aquela cena pensei nos muitos fiéis confinados dentro da igreja, que encontram segurança nas cadeias dos dogmas religiosos, mas que desejam ardentemente alcançar os ares da liberdade em Cristo, mas são advertidos do perigo que é viver em liberdade.
Contudo, uma vez encontrado o alvedrio fogem para longe - não sem maldições e juras de morte - e alcançam os ares da graça prometidas por Cristo e podem viver de maneira franca desfrutando do frescor do vento e do indulto encontrado nesse mundo.
Experimentam novamente a clemência do primeiro amor em Jesus, sabendo que a qualquer hora o mal pode lhes atacar, mas valerá a pena correr o perigo. E, finalmente estabelecerá a doidice revelada por alguém, sem juízo, de que viver em verdade era ser livre.